
Mulher nossa de cada dia
De Atenas, do Islã, da Bósnia, de Santiago ou da América. Mulheres tantas, doces, tristes, infelizes, loucas, louras, amargas, recatadas, duras, oferecidas, assustadas.
Mulheres tantas e tantas que por aqui não passariam todas, que a nós não diriam tudo e que ao mundo pedem tão pouco.
Mulheres lindas, mutiladas, agredidas, agressivas, gritando conquistas, pedindo socorro, de filho na barriga, mais um no colo e outro no mundo.
Mulheres princesas, de um dia ou de uma vida inteira, donas de poder, presas ao discurso, rebeldes ao discurso, que apontam, condenam, calam e negam.
Mulheres de todas as prendas, do retrato na parede, toalha de linho e sininho à mesa, de saiotes engomados, de roupa nenhuma, apaixonadas igualmente.
Mulheres do passado e do agora, de panelas vazias e cabeça cheia, de barriga vazia e alma em transe, de coração vazio e existência absurda.
Mulheres do povo, do mundo, dos homens, guardadas em véus, expostas em sombras, tingidas de dor, alucinadas de prazer e sonho.
Mulheres meninas, fazendo meninos, parindo anjos, banhando-se em luz, comendo ilusão, pisando em falso, abraçando agonias.
Mulheres meninas, também, de véu, grinalda e planos de juras eternas e amores nem tanto, de missão cumprida e vontade esquecida.
Mulheres que dão vida, que deram a vida, empunharam bandeiras, saíram em busca, valeram princípios e deixaram sementes.
Mulheres de anos vividos, rosto enrugado, de ventre árido, de sangue acabado, de tempo que desaprova e não permite.
Mulheres atônitas, na essência de si mesmas, perguntando quem são e quanto são entre a vontade e a culpa e descobrindo, incrédulas, que são tudo na misteriosa fragmentação.